Este blog é uma reunião de textos exclusivamente autorais. Para conhecer mais de mim, dividir sons e sabores poéticos, musicais, cinematográficos, e tantos outros cheiros mais além dos meus, venha tomar um expresso esparramado nas almofadas fofas do meu outro blog, o Abundante-mente. Te espero lá com as velas acesas.

26 de outubro de 2009

Grito mudo

Às vezes queima tanto, mas tanto, que é como se o peito estivesse sendo dilacerado pelas unhas mais afiadas... A vontade que dá é de soltar um urro e lançar tudo pela janela - ver voar roupas, objetos e sofrimento - pra depois sentar na quina do rodapé, com as pernas dobradas e a testa encostada nos joelhos, e cantarolar baixinho, como que ninando o choro, como que acalmando a fera.
Às vezes dói tanto, mas tanto, que é como se a cabeça estivesse sendo esmagada por uma prensa gigante... A vontade que dá é de sair correndo, com os braços abertos, deixando que o vento carregue pra longe tudo o que fere - pra depois cair no mar e nadar, nadar com fúria, até ficar exausta e não sentir mais nada: nem as pernas, nem os braços, nem a garganta, que insiste em fechar.

A vontade que dá é de esmurrar as paredes, até os nós dos dedos sangrarem.
A vontade que dá é de arrancar os cabelos aos tufos, com toda força do mundo.
A vontade que dá é de dormir encolhida no chão do banheiro.
E nunca mais acordar.

Mas vontade passa.
Enquanto espero que ela vá, mastigo os cantos das unhas, recuso comida e soluço trancada no armário. (Sim, eu me firo. Faço isso porque me sinto incapaz de ferir qualquer outro que não seja eu mesma.)
Vontade passa. E eu ainda tenho forças pra fazer ela passar...
Enquanto espero que ela vá, olho pro mundo com aqueles olhos distantes de incredulidade, sem ver um palmo à frente.

Ainda bem que vontade passa...

Sylvia Araujo

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